terça-feira, 10 de janeiro de 2023

Neo, Cypher e o culto a epistemofobia

 

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          O filme Matrix, lançado em 1999, marcou a história do Cinema, não só pela inovação tecnológica nos efeitos especiais e uso de câmeras, tão pouco porque apresentava um futuro distópico, outros já haviam sido apresentados pela 7°Arte.


Matrix marcou  a mente dos espectadores principalmente porque trouxe em meio as cenas de ação questionamentos filosóficos que não eram usuais nesse tipo de cinema (o cinema pipocão).

Um dos conceitos que mais me marcaram no filme foi o de que nem tudo (ou quase nada) que percebemos é (ou pode ser) real.

Relembrando: No filme os humanos vivem presos dentro de uma realidade virtual desenvolvida por máquinas inteligentes, entre os humanos existem os libertos que lutam contra essas máquinas fazendo o que podem para libertar outras mentes. Uma clara referência a famosa "Caverna de Platão"?

Sim, mas tem mais aí...


Podemos pensar no filme como simplesmente uma, roupagem nova da alegoria de Platão, mas também podemos pensar em outras coisas: as que tocam na parte da realidade factual do mundo em que vivemos e na falha dos nossos sentidos em perceber todos os detalhes e variações que nos cercam; podemos também pensar  que se trata de uma critica a sociedade humana como um todo, nas amarras invisíveis que nos cercam, desenvolvidas  por estruturas sociais que muitas vezes (normalmente) fogem do nosso olhar, pois estamos tão inseridos nessa estrutura que é "uma prisão que não pode ver, sentir ou tocar" como diz Morpheus para o herói do filme, Neo.


Essa disputa da realidade e a nossa impossibilidade de enxergar o que é real tem ligações com a filosofia do conhecimento mas também fica clara (pelo menos para mim) uma ligação com a sociologia de tradição marxista," e a luta social impossível" de Bourdieu parece se materializar no filme através  da impossibilidade dos não libertos de compreender a realidade que os cerca e muito menos lutar contra ela.

Nessa "batalha" que envolve todo o ser, de maneira integral com sua condição, a percepção real do mundo parece um fardo pesado demais, no filme "alguns não aguentam e enlouquecem" diz um personagem, pode ser que não só no filme  aconteça isso. Na sociedade, muitos preferem se agarrar em certezas nebulosas ao invés de arriscar um conhecer mais profundo, um conhecer do mundo e de si mesmos.

Tentar “despertar” de maneira mais integral (corpo e mente), sem os dualismos cartesianos pré configurados em nós de maneira tão profunda não é tarefa fácil.


Reconhecer que “neste corpo tem gente!” que somos complexos e completos, que não somos simplesmente uma pilha de energia, requer um salto de "fé" como Neo faz no filme. Requer uma disponibilidadel de fazer grande esforços que nem sempre estamos dispostos a realizar. Ainda mais quando parece que todos os esforços para obter conhecimentos mais profundos, produzem poucos resultados positivos (isso quando produzem).


Para muitos, o verdadeiro herói do filme é o vilão Cypher, com sua frase icônica "A ignorância é uma bênção!"  porém nos dias de hoje já podemos ver onde a epistemofobia tem levado grande parte da sociedade e como isso pode ser e é desastroso.

Embora essa busca pela sabedoria possa ser muitas vezes dolorosa, porque em muitos momentos irá envolver se esforçar mais ou abandonar crenças pessoais que se mostram falsas, ainda assim a busca pelo conhecimento (e autoconhecimento) se mostra o único caminho possível para nos tornar mais completos como seres humanos e como sociedade. 

E embora possa ser uma tarefa hercúlea, abrir os olhos e tomar a pílula vermelha, ainda deve ser o caminho...


Matrix (1999)

 Direção: Irmãs Wachowski 

Com: Keanu Reeves, Carrie Anne-Moss, Laurence Fishburne e Hugo Weaving

Nota: 9,0 


Referências

Matrix, Lara e Lana Wachowski, 1999, Warner Bros.

Escola e Democracia, Dermeval Saviani, 1986, Cortex Editora.

Livro, Nesse Corpo Tem Gente! - Um Olhar Para Humanizar O Nosso Corpo, Maria Lucia Teixeira da Silva, 2013, Casa Do Psicólogo.

O que é Aprender?, Hugo Assman.

Corporeidade Humana, uma complexa trama transdisciplinar no aprender, Clésio José dos Santos Gonçalves.

A República, Platão.

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